Opinião
A Alemanha a empurrar com a barriga
É de uma trágica ironia que a maior ameaça à estabilidade do sistema financeiro europeu possa vir da Alemanha, o país que há anos dá lições de estabilidade e solidez à Europa. O "made in Germany" atravessa uma crise existencial.
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O Deutsche Bank é um mastodonte da alta finança mundial. Os activos que carrega no balanço valem 1,6 biliões de euros: o equivalente a metade do PIB alemão. Na categoria dos "bancos grandes demais para falir" é um dos maiores e dos piores: em Junho, o FMI dizia que o banco alemão foi o que mais contribuiu para o risco sistémico global. As comparações com 2008 surgem com facilidade e a nervoseira já atacou os mercados.
Há muito que nos meios financeiros se comenta o enorme risco que o Deutsche Bank carrega, comparado a um gigantesco "hedge fund". O nível de ansiedade cresceu em Fevereiro quando surgiram dúvidas sobre a capacidade do banco para pagar os juros de títulos subordinados que emitiu para fortalecer o seu capital, face à baixa rentabilidade gerada.
O CEO veio dizer que o banco é sólido, como uma rocha, e que não precisa de ser salvo pelo Estado. Os portugueses conhecem bem, e por experiência própria, o que este tipo de garantia pública costuma prenunciar. Apressou-se ainda a vender uma seguradora britânica para anunciar um encaixe de mil milhões de euros.
Os nervos são justificados, mas podem ser exagerados. Mesmo que o pior cenário para o Deutsche Bank se viesse a confirmar, há uma força imensa em ser um "banco demasiado grande para falir": ninguém deixará que isso aconteça. E o Governo alemão certamente não o deixará, mesmo que agora o negue. A decisão deixa Merkel entre a espada e a parede: ser trespassada pelos danos na economia ou esmagada pelos danos eleitorais de um salvamento público. Caso o Estado seja chamado a intervir, será interessante perceber como a chanceler e o seu ministro das Finanças conseguirão fugir à ortodoxia na aplicação das regras do "bail-in" que impõem noutros países.
Seja qual for o desfecho, e espera-se que seja o mais benigno possível, ficou mais evidente a situação frágil em que ainda se encontra o sector financeiro da Zona Euro. E este caso, tal como o da banca italiana, é revelador de que empurrar os problemas com a barriga está longe de ser um desporto nacional. Com uma agravante: as consequências agora poderão ser muito mais graves.